Mesmo sabendo que se trata de uma data que o marketing de massa desvirtuou, mesmo sendo alérgica a corações e peluches, cartões com frases pindéricas e programas pretensiosamente românticos, é inevitável escapar à mixórdia temática do Dia dos Namorados, que decreta que devemos fazer uma surpresa à cara-metade ou alinhar num desses eventos para descasados, descomprometidos ou ressabiados.
Muitas empresas já descobriram que o amor (e seus sucedâneos) são um grande negócio.
Não me refiro apenas à restauração e à hotelaria, que nessa data - que este ano até proporciona um jantar com direito a pequeno-almoço, com duas noites de pernoita para os mais afortunados - colocam umas velas na mesa e uns nomes sofisticados no menu para se cobrarem de uns imerecidos euros em jantares pálidos para casais apáticos. Tudo o que é loja de flores, de roupa ou de artigos para a casa recicla a oferta, concede-se uma derradeira oportunidade para despachar saldos ou comercializar avanços de temporada, recupera das arrecadações o espólio de inutilidades fofinhas que com sorte vão ser oferecidas com laço a um parceiro numa data que o calendário obriga a celebrar. Há ainda as perfumarias, os spa's, os programas radicais e as surpresas preparadas em série que um dos elementos do casal compra em stress ou com esmero apurado e que o outro recebe com apupo ou com aplauso.
Confesso que comemoro a data. Nos anos recentes o S. Valentim tem para mim e para o meu "companheiro de estrada" uma simbologia própria que me escuso partilhar.
O que partilho sim são dicas de marketing que encontrei na net sobre como potencial vendas nesta data:
O super fashion restaurante Gilgameshbar em Londres criou um cocktail chamado "Diamonds are forever" especialmente para esta ocasião. O cocktail acompanha o menu especial para o jantar de S. Valentim e é claro que namorado algum ousará não pedir a bebida mesmo custando esta mais de 10 libras (quase 13 euros). A inovação não é a bebida em si e o preço nem sequer é questionável quando a promessa é que um dos convivas da noite terá a forte probabilidade de encontrar um diamante verdadeiro no fundo do copo. Esta pedrinha é disponibilizada pela joalharia Madison Diamond Rings onde o felizardo é convidado a assemblar o presente que lhe foi servido num belíssimo anel tipo noivado.
Este é o verdadeiro exemplo de uma promoção cruzada que dá poucas hipóteses de fuga ao mercado-alvo, sendo certo que muitas das meninas que se sentarem no Gilgamesh estarão à espera do anel no dedo durante ou na sequência dessa noite, seja pelo efeito do álcool seja de espontânea vontade...
No Debenhams a estratégia foi criar um guia com o epopeico nome "Mandamentos da Lingerie" com o intuito de ajudar homens românticos a comprarem o conjunto adequado para a sua partenaire. A estratégia tem um intuito óbvio de gerar vendas mas também de minimizar o complicado processo de trocas que normalmente se sucede a datas como esta.
A pouco romântica marca de bebida Dr Pepper desenvolveu uma campanha orientada para o mercado adolescente através de uma app do Facebook. A mecânica ajusta-se como uma luva ao histerismo das meninas de catorze anos já que quando o utilizador faz um "like" na App é girada uma garrafa entre seis amigos identificados previamente e enviada uma mensagem de S. Valentim para o mural daquele que for aleatoriamente selecionado.
A PWC, uma das empresas que só com uma imaginação prodigiosa se pode associar a marketing romântico, aproveitou a proximidade da data para visitar campus universitários com potenciais recrutadores identificados com balões em forma de coração com a frase "Being the one at the heart of the best opportunities".
A empresa Blur, especializada em crowdsourcing e marketing digital, concede aos seus clientes - empresas e criativos - a oportunidade de declararem o seu amor uns pelos outros, ou de eventualmente carpirem as suas mágoas. Esta agência já não é convencional na forma como faz coincidir clientes e prestadores de serviços, oferecendo-se como o "intermediário casamenteiro" entre quem quer pagar marketing e quem tem qualidade para o vender.
Estes exemplos mostram como o 14 de Fevereiro é apenas mais um dia para dar asas à criatividade...
O conceito não é novo e fiquei surpreendida por este endereço ainda estar disponível. Afinal o óbvio nem sempre é uma evidência para o comum dos mortais. Confirma-se que as boas ideias, por mais banais e banalizadas, podem sempre ser usadas, recicladas, convertidas em tesourinhos deprimentes ou elevadas ao estatuto de vintage.
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