domingo, 13 de abril de 2014

Um país pode ser uma marca?

Uma marca é uma impressão digital.
A marca identifica um produto, uma coisa, um serviço, um sítio, uma pessoa, uma empresa, um estilo de vida...
Basicamente podemos associar uma marca a uma série de bens, tangíveis ou intangíveis, objectivos ou subjectivos, finitos e físicos ou relativos e incorpóreos.
Os países também podem ser marcas, porque o querem e procuram... ou porque simplesmente lhes acontece, na sequência de uma cultura consistente orientada para uma força ou vantagem competitiva que o mundo reconhece e identifica de forma espontânea.
Portugal procura há algum tempo desenvolver-se como marca.
Ninguém dúvida que os nossos vinhos são óptimos, que o azeite é excelente, que os sapatos são de extrema qualidade, que somos bons e versáteis na produção têxtil... 
O problema é que Portugal, por inequívoca culpa dos portugueses - provavelmente o povo mais crítico e anti-nacionalista que conheço - cultivou durante anos uma imagem negativa de gente pobre e pouco produtiva, básica na escolaridade e fraca em iniciativa. 
Enquanto destino turístico, apesar das paisagens extraordinárias, das praias a perder de vista, do património histórico e da inebriante gastronomia, permitimos que durante décadas os estrangeiros nos vissem como uma espécie de praia espanhola com crescimento imobiliário desgovernado e um povo de bigode, afável mas mediano, conformado com a má sorte e os "-inhos" desta vida.
A marca de um país baseia-se em recursos humanos e naturais. 
Infelizmente para nós, que até temos um certo charme latino e vivemos num país com muitos recantos mágicos, fazer de um país uma marca forte depende muito de um outro factor que não é aleatório nem espontâneo: a logística/infra-estruturas.
As infra-estruturas não são apenas as estradas como acreditaram certos Governos que nos amaldiçoaram até ao fim dos nossos dias. Um país forte é consistente nas infra-estruturas ditas pesadas - boas estradas, formas de comunicação optimizadas, fontes energéticas sólidas, um domínio da água, do ar e da terra -, mas também é distinto em infra-estruturas ditas soft, como a economia, a educação, a saúde, a justiça... Convém também que o seu povo se distinga de alguma forma dos outros por alguma característica ou capacidade singular, como se destacam os italianos pela sua apetência para a moda ou os russos pela sua superioridade no desporto.
Portugal tem muitas debilidades a nível infra-estrutural... mas talvez não tantas como crêem os portugueses. Quanto aos seus habitantes, se retiramos os que não cantam o fado, fica um pouco nebulosa a identificação dessa qualidade nacional que nos diferencia dos espanhóis e dos gregos.
maior vantagem competitiva de Portugal não são as praias, nem a comida nem os sapatos mas sim um património que esta nação foi capaz de difundir à escala mundial com um valor mais elevado do que milhões de litros de vinho ou de azeite: a língua portuguesa.

Portugal já foi grande, maior do que as suas próprias fronteiras. O que resta dessa grandeza é um orgulho envergonhado, alguns nomes de ruas e um incontável acervo de ruínas. Ficou também uma herança com a qual podemos definitivamente perpetuar-nos como marca internacional: o português.
A substituição de uma imagem de Portugal enquanto país fraco, de pescadores, de operários e mulheres de buço, pela percepção de uma nação forte e de vanguarda, é um trabalho árduo que não se consegue com a comunicação institucional, que invariavelmente evoca Sintra e o Algarve como cartões postais de um país pequenino, mas antes com a elevação da cultura escrita e falada, com a divulgação de artistas que nos cantam e pintam, com a difusão do talento que com suas notas e traços de raíz lusitana deixa uma indelével marca de identidade no mundo.
Naturalmente este trabalho a favor da notoriedade e do reconhecimento não é imediato. Os progressos tendem a ser ténues, dificilmente mensuráveis, de resultados nem sempre óbvios ou animadores. Mas o resultado final, aquilo que se pode esperar a partir do momento em que tudo o que "fala português" seja reconhecido e apreciado, é a associação de Portugal a uma marca histórica, épica, gloriosa, culturalmente soberana, mais alta e mais ampla do que uma herdade alentejana ou do que um socalco vinhateiro no Douro.

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