segunda-feira, 26 de maio de 2014

Less is more?!?!?!?!


O "less is more" é uma frase politicamente correcta que nos faz parecer felizes na condição de pobrezinhos ou de remediados.
Na verdade, tirando a questão do design minimal que retirou das nossas casas carradas de tarecos e de porcelanas, ou a moda do casual chique que nos faz parecer muito fashion sem necessidade de grandes adereços ou de saltos altos, o menos é uma situação de subtracção que extraí das nossas vidas um pouco de qualidade.
Um estudo da Havas Worldwide acabado de sair - The New Consumer and the Sharing Economy - revela que 70% dos inquiridos acreditam que o sobreconsumo está a colocar em risco o planeta e a sociedade, e que 50% afirmam que podiam viver feliz com metade das coisas que possui.
Bullshit!
O estudo confirma o surgimento de novos modelos de partilha e de colaboração, fenómenos que confirmamos todos os que aderiram à moda da marmita, os que partilham boleias para reduzir a factura do combustível ou passeiam frequentemente pelo Olx ou pelos sites de descontos e de promoções.
O que não me parece é que tais mudanças decorram de uma maior preocupação com o impacto dos nossos capitalistas hábitos de consumo, mas antes de uma desgraçada conjuntura económica.
É claro que nos tornamos mais "verdes" e "amigos dos animais", mas esta maior apetência para a bondade e para a solidariedade social não indiciam a emergência de uma sociedade de anjos benfeitores, candidatos a um lugar no céu, são antes um reflexo de necessidades reais de sacrifício e de entre-ajuda potenciadas pela falta de emprego e pela revisão em baixa dos níveis salariais. 
Este estudo baseia-se numa amostra de 10.574 pessoas, em 29 mercados, incluindo Portugal. 
Admito que as minhas generalizações possam ser extremas mas custa-me a acreditar que estas alminhas se proponham a mudar de segmento porque querem e não porque a isso são obrigadas.
Concordamos todos que entre a subsistência e o consumismo histérico existe um ponto de equilíbrio que corresponde ao "comprar o necessário". Sucede porém que o que consideramos necessário hoje requer muito mais euros do nosso salário do que o equivalente em escudos no tempo dos nossos pais.
O estudo acaba por ser contraditório nas suas conclusões quando por um lado revela que os consumidores atestam que o sobre-consumo nos está a levar ao colapso, mas por outro lado, defendem que o consumo é um dever patriótico já que assegura o crescimento económico. 
Somos pois esquizofrénicos ao ponto de nos evangelizarmos de acordo com princípios inspirados no estilo de vida dos monges tibetanos, desde que, entre a meditação e o jejum depurativo, nos seja permitido deslizar o dedo pelo i-pad, vestir umas túnicas de griffe e pestiscar umas tapas (gourmet, claro!).
A descarga de consciência para estes consumidores clean é inventarem um propósito para o que consomem, como se os pressupostos da ecologia, do emprego ou da sustentabilidade convertessem o consumo num acto altruísta e não na experiência hedonista que quase sempre é. 
O que o estudo concluí é que muitas das nossas decisões de compra são ponderadas com valores sociais, variáveis que me custa acreditar sejam tão relevantes quanto a marca ou preço.
O que o marketing vai lucrando com crenças como estas é a possibilidade de reciclagem de obsoletos com o rótulo de vintage, ressuscitando produtos/marcas que noutras décadas de outro consumo menos civilizado foram dados como moribundas ou mesmo mortas.
Existe uma espécie de poder pérfido na possibilidade de comprar selectivamente sem ceder a impulsos ou tentações. Presumo que seja o equivalente ao prazer que saboreia a anoréctica por ser mais forte do que a sua própria fome... Este prazer só existe contudo quando a opção de não compra é uma decisão consciente e deliberada. Infelizmente, parece-me que predominam no mercado os aspirantes a consumidores que não compram simplesmente porque não podem...


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